A publicação, pelo governo federal, da Medida Provisória n. 746/2016 provocou muitas reações contrárias em todo o Brasil. Especialistas da área da Educação avaliaram o documento como apressado e unilateral, já que a sociedade, de modo geral, e os profissionais do ensino, especificamente, não foram ouvidos.
Na Unicentro, professores e alunos do Departamento de Letras do campus de Irati ligados à oferta do curso de Língua Espanhola e Literaturas de Língua Espanhola lançaram um manifesto de repúdio à MP 746/2016. “Se trata de um momento caótico para a educação brasileira”, avalia a professora Cibele Krause-Lemke. Sem aceitar as decisões federais passivamente, ela afirma que professores e alunos do curso de Letras Língua Espanhola querem incitar a discussão do tema e as implicações da Medida Provisória.
Leia abaixo, na íntegra, o Manifesto de Repúdio produzido e publicado pelos professores e alunos do cursos de Letras Espanhol:

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MANIFESTO DE REPÚDIO À MEDIDA PROVISÓRIA 746/16

Nós, professores e alunos do Curso de Letras – Língua Espanhola e Literaturas de Língua Espanhola da Universidade Estadual do Centro-Oeste, manifestamo-nos contrários a MP 746/16, tendo em vista os seguintes aspectos:
1o – A retirada da obrigatoriedade de oferta da Língua Espanhola da matriz curricular, além de ir contra ao definido pela Lei 11.161/2005 (revogada pela presente MP), ignora o espaço geopolítico e cultural no qual se insere o Brasil. Ao fazê-lo, impossibilita o acesso aos bens culturais produzidos no cenário latino-americano, bem como impõe uma política monolinguista.
Cabe mencionar a importância da Língua Espanhola, e de sua cultura, no cenário mundial, já que é a segunda língua mais falada no mundo. Dados divulgados pelo Instituto Cervantes e publicados, também, pela Agência EFE de notícias, no mundo todo, 21 milhões de pessoas estudam espanhol como língua estrangeira, o que representa um aumento de quase 1,5 milhão com relação a um levantamento realizado em 2014. Também é a terceira língua mais usada na internet.
Além disso, os microdados disponíveis no site do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), apontam que a Língua Espanhola é a língua que mais candidatos inscritos ao exame escolhem para a realização da prova de Língua Estrangeira. Assim, ao excluírem esta língua do currículo escolar, perde-se um grande espaço de interlocução que a aprendizagem de línguas proporciona.
Somos favoráveis, portanto, que a educação básica permita ao aluno um espaço multilíngue e que as línguas sejam concebidas como possibilidades de acesso ao mundo cultural, literário, tecnológico, fundamentais para o intercâmbio e construção de conhecimento.
2o – A possibilidade de que pessoas qualificadas com que se designou notório saber possam assumir as funções do magistério precariza ainda mais o trabalho docente, pois este deixará de ser valorizado, como também desemprega docentes que, devido a sua especialidade, perdem espaço para pessoas que não são habilitadas ao magistério.
Conforme a Resolução 02/2015 – MEC/CNE, em seu Art. 1o, § 1o, consta:
“Compreende-se a docência como ação educativa e como processo pedagógico intencional e metódico, envolvendo conhecimentos específicos, interdisciplinares e pedagógicos, conceitos, princípios e objetivos da formação que se desenvolvem na construção e apropriação dos valores éticos, linguísticos, estéticos e políticos do conhecimento inerentes à sólida formação científica e cultural do ensinar/aprender, à socialização e construção de conhecimentos e sua inovação, em diálogo constante entre diferentes visões de mundo.
§ 2o – No exercício da docência, a ação do profissional do magistério da educação básica é permeada por dimensões técnicas, políticas, éticas e estéticas por meio de sólida formação, envolvendo o domínio e manejo de conteúdos e metodologias, diversas linguagens, tecnologias e inovações, contribuindo para ampliar a visão e a atuação desse profissional.
Art. 3o
§ 4o – Os profissionais do magistério da educação básica compreendem aqueles que exercem atividades de docência e demais atividades pedagógicas, incluindo a gestão educacional dos sistemas de ensino e das unidades escolares de educação básica, nas diversas etapas e modalidades de educação (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio, educação de jovens e adultos, educação especial, educação profissional e técnica de nível médio, educação escolar indígena, educação do campo, educação escolar quilombola e educação a distância), e possuem a formação mínima exigida pela legislação federal das Diretrizes e Bases da Educação Nacional”.
Neste sentido, a MP 746/16 não atende a Resolução supracitada, ao não considerar que a formação do professor se dá por uma sólida formação teórico-prática, e ao contemplar como válidos saberes tecnicistas para o exercício do magistério.
3o – Ao propor a oferta facultativa das disciplinas de Artes, Filosofia, Sociologia, Educação Física, Geografia e História, impossibilita o desenvolvimento do senso crítico dos alunos, bem como o exercício pleno de sua cidadania.
Por fim, lamentamos que mudanças tão profundas vinculadas a uma proposta para o Ensino Médio brasileiro sejam publicadas via medida provisória, sem o debate com a comunidade, bem como com profissionais e pesquisadores da área.
Irati, 28 de setembro de 2016.